Donald Trump criticou a conferência do clima (COP) e sua ausência oficial marcou as negociações em Belém. O ex-presidente saiu do Acordo de Paris e optou por não enviar uma delegação formal para o encontro — situação inédita para uma conferência climática da ONU desde a ECO de 1992, no Rio de Janeiro. Ainda assim, a presença americana se manifesta por meio de aliados que participam das negociações assumindo posições alinhadas ao governo.
Nas redes sociais, a crítica principal focou na construção de uma estrada para facilitar o acesso de ambientalistas à conferência. Esse episódio foi usado como argumento para deslegitimar a COP, com o uso de termos que geraram repercussão e a caracterização do evento como um escândalo. A referência à estrada e às consequências ambientais já constou em reportagens anteriores; neste caso, o episódio passou a ser invocado para questionar o valor da agenda climática como um todo.
A atuação política e comunicacional que visa minar a credibilidade do encontro deve influenciar as duas semanas de negociações. Representantes alinhados à postura do governo norte-americano devem adotar posições que reflitam essa crítica, o que acende um alerta entre diplomatas sobre o efeito dessa estratégia na legitimação e na condução dos debates em Belém.
No plano interno dos Estados Unidos, uma política de deportações anunciada como a maior da história vem sendo executada. Ao mesmo tempo, observa-se um movimento notável de cidadãos americanos buscando alternativas de cidadania e passaporte estrangeiro. Países de língua inglesa como Reino Unido, Irlanda e Canadá registraram um aumento expressivo nos pedidos de cidadania ou de passaporte por parte de americanos — em muitos casos por meio de vínculos familiares, como avós ou bisavós que possibilitam a obtenção de nacionalidade alternativa.
No primeiro semestre do ano, o número de pedidos de passaporte britânico por americanos cresceu entre 40% e 50%. Após a eleição do ex-presidente, a busca por informações sobre mudança para o Canadá, medida por volume de pesquisas online, chegou a registrar aumento da ordem de 5.000% em determinado momento. Esses dados refletem um mal-estar que tem levado americanos a considerar a obtenção de um segundo passaporte como precaução.
O fenômeno ganhou até denominação coloquial em alguns meios: uma junção entre “refugees” e “Trump”, usada para identificar cidadãos que planejam deixar o país ou obter outra cidadania em resposta às medidas e ao clima político atual. Em português, expressões informais têm sido propostas para traduzir esse neologismo e já há sites voltados a facilitar processos de mudança e obtenção de cidadania para esses públicos.
A combinação entre a postura pública do ex-presidente em relação à COP e as repercussões domésticas revela um efeito dual: no campo internacional, a tentativa de desgastar a legitimidade das negociações climáticas; no campo interno, uma parcela da população americana busca alternativas de mobilidade e documentação que lhes permitam residir fora do país caso optem por isso. Esse duplo movimento tem impactos diplomáticos e sociais que passam a constar no debate sobre a atual conjuntura política.
As reações dos representantes que estiveram ou estarão em Belém indicam atenção redobrada para as estratégias de comunicação e negociação que possam surgir nas próximas semanas. Ao mesmo tempo, o aumento de solicitações de cidadania e passaporte em países receptores traz um componente prático: consulados e estruturas administrativas enfrentam volume maior de demandas, sobretudo quando há comprovação de vínculo ancestral que facilita a obtenção de um segundo passaporte.
A convergência entre crítica pública, ausência formal e movimento migratório é um elemento a ser acompanhado ao longo do processo de negociações climáticas e das próximas decisões políticas nos Estados Unidos. O episódio também levanta questões sobre a circulação de pessoas e sobre como políticas internas e discursos públicos podem reverberar em ações concretas de mobilidade internacional.
