A iminência de uma guerra na Venezuela pode desandar as negociações em andamento entre Brasil e Estados Unidos sobre o tarifaço? O debate ganha corpo, à medida que navios, aeronaves e até submarinos fazem operações na costa do país sul-americano, inclusive com mortes durante bombardeios em embarcações.
Para o governo americano, as ações ocorrem em águas internacionais contra alegado tráfico de drogas com destino aos Estados Unidos, o que é confrontado pelo regime de Nicolás Maduro.
Em meio a tudo isso, está o Brasil, um país alvo das sobretarifas americanas e que ainda mantém relações diplomáticas com a Venezuela, apesar das rusgas entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Maduro, após a última eleição presidencial no país vizinho, em julho de 2024.
Naquela ocasião, Lula cobrou as atas que afastariam suspeitas sobre o pleito que reelegeu Maduro, mas o chavista não as divulgou, apoiado por parlamentares aliados e justiça eleitoral. Nas semanas subsequentes, o brasileiro e o venezuelano trocaram farpas.
O Brasil, inclusive, vetou o ingresso da Venezuela no Brics. Em retaliação, Caracas convocou o embaixador do governo venezuelano, alocado em Brasília, e o encarregado de negócio brasileiro no território do país caribenho.
“Venezuelano dono do próprio destino”
Mais recentemente, Lula defendeu que o povo venezuelano seja “dono do próprio destino”, ao discursar no congresso partidário do PCdoB, em Brasília, na última quinta-feira (18). Sem citar os EUA, criticou o que chamou de “palpite” de outros países contra a Venezuela e Cuba.
“O que defendemos é que o venezuelano é dono de seu destino e não é nenhum presidente de outro país que tem que dar palpite de como vai ser a Venezuela ou Cuba”, declarou Lula.
Sem riscos para o Brasil?
Apesar dessas idas e vindas entre Brasil e Venezuela e extrema disparidade ideológica dos EUA com o regime de Maduro, o professor de relações internacionais Leonardo Trevisan não vê riscos para o Brasil, no que diz respeito às negociações sobre o tarifaço.
“São vários setores que têm interesse em manter um bom relacionamento comercial com o Brasil. Não é só o café. Não é só o suco de laranja. São fortes competidores por causa da questão inflacionária”, pontuou o professor.
Para o especialista, o Brasil se beneficia do “forte componente comercial muito espalhado na economia americana”, o que pode encarecer o consumo nos EUA. Além disso, conforme explicou Trevisan, o principal interesse de Washington na Venezuela, além da questão ideológica, é o petróleo.
“A questão com a Venezuela tem outro perfil. É um perfil absolutamente político, de uma ala mais ideológica dentro do Departamento de Estado. É preciso notar que a situação com a Venezuela envolve, especialmente, petróleo. É um produto só, muito importante, em disputa. A Venezuela tem a maior reserva de petróleo do mundo”, continuou o especialista.
“Sinal público de entendimento”
Trevisan ainda relembrou que o comunicado conjunto divulgado pelas diplomacias brasileira e americana é um sinal público de entendimento entre Brasil e EUA, diferente do ocorre na Venezuela.
“A situação do encontro entre Marco Rubio e Mauro Vieira produziu um comunicado conjunto, o que é uma coisa mais ou menos inédita nesse tipo de situação. Isso é um sinal público de entendimento. No caso da Venezuela, o quadro é bastante diferente”, completou Trevisan.
O próximo capítulo das negociações entre Brasil e EUA, após reunião entre o brasileiro Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores, e o americano Marco Rubio, secretário de Estado, é um possível encontre de Lula com Trump. Os dois presidentes, inclusive, chegaram a trocar afagos e reforçam a ideia de que “rolou uma química” entre ambos.